quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Lewandowski não vê prova de compra de votos e absolve Dirceu

Foto: Fabio Pozzebom/Agência Brasil

O Ministério Público Federal (MPF) não conseguiu provar as imputações contra o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e a compra de votos de parlamentares no Congresso Nacional, afirmou nesta quinta-feira o ministro Ricardo Lewandowski ao votar pela absolvição do acusado de liderar o esquema criminoso de compra de apoio parlamentar durante o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O revisor do processo do mensalão disse não ter encontrado "nada nos autos" contra Dirceu, entendendo que as imputações contra o réu "são muito mais políticas do que estritamente jurídicas".
Para minimizar a tese da compra de votos, e consequentemente o envolvimento de Dirceu no esquema, Lewandowski leu um estudo apresentado pelo deputado Odair Cunha (PT-MG) no qual tenta negar a relação entre repasses feitos a parlamentares da base aliada e votações na Câmara dos Deputados. "O estudo evidenciou que, no período eleitoral, o governo manteve o índice de infidelidade maior com os partidos da base", afirmou.
O revisor leu uma série de depoimentos de parlamentares que negaram a compra de votos durante o primeiro mandato do governo Lula. "Não estou dizendo que não possa ter havido eventual compra de votos aqui ou acolá. Estou dizendo que há provas para todos os gostos neste acervo probatório de quase 60 mil páginas", disse Lewandowski, que considerou "frágeis" as provas do ponto central da denúncia. Segundo ele, a prova de pagamentos a parlamentares é encampada apenas pelo "inimigo declarado" de Dirceu, o presidente do PTB, Roberto Jefferson, não sendo sustentada por nenhuma outra testemunha.
O voto de Lewandowski provocou questionamentos de colegas. O ministro Gilmar Mendes perguntou se não há haveria contradição na posição do revisor, que condenou réus por corrupção passiva, ou seja, pelo recebimento de vantagem indevida. "Eu disse que estava seguindo a orientação do Plenário no sentido de dizer que basta a oferta ou receptação da vantagem indevida para que fique configurada a corrupção passiva", respondeu Lewandowski.
Gilmar Mendes então afirmou que o Plenário viu o ato de ofício: o apoio político dos réus que receberam o dinheiro. "Não há nenhuma contradição no meu voto. Só que eu não identifico o ato de ofício, porque não acho que haja necessidade", disse. Em uma das divagações, Lewandowski desqualificou a denúncia, que só tenta provar a compra de parlamentares na Câmara na tentativa de aprovar as reformas da Previdência e a Tributária. "Compra-se a Câmara e não se compra o Senado?", questionou.
Lewandowski centralizou a responsabilidade dos repasses financeiros a parlamentares na figura do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o qual condenou ontem por corrupção ativa, chamando-o de "onipresente" no processo. Para o ministro, o tesoureiro coordenava sozinho as finanças do partido, não tendo sido provado o envolvimento do ex-presidente do partido José Genoino, o qual ele absolveu ontem, e o ex-ministro José Dirceu.
"Ficou constatado que José Dirceu afastou-se do PT ao assumir o cargo de ministro chefe da Casa Civil, não sendo responsável pelos atos do partido", disse o revisor. "O MPF não logrou produzir provas sobre a relação entre Dirceu e Delúbio, o qual agia com total independência no que toca as finanças do partido", acrescentou.
"Eu tenho que julgar o que está nos autos", repetiu diversas vezes durante seu voto, no qual classificou a acusação contra Dirceu de uma "atecnia" gritante. "Supor-se que ele estivesse manejando os cordéis de um teatro de fantoche é uma possibilidade, mas não é uma realidade processual", sustentou.
O Ministério Público também não provou a relação de Marcos Valério, apontado como operador do mensalão, e o ex-ministro da Casa Civil, disse Lewandowski, que tentou desqualificar o depoimento do presidente licenciado do PTB, Roberto Jefferson. O ex-deputado, já condenado pelo Supremo, relacionou o petista à viagem de Marcos Valério, o ex-secretário do PTB Emerson Palmieri e Rogério Tolentino a Portugal. O réu afirmou, em juízo, que Dirceu pediu a indicação de alguém do PTB para ir a Portugal tratar de interesses entre o partido e o PT.
"Esse réu (Roberto Jefferson) é o inimigo figadal de José Dirceu e tentou incrimina-lo e traze-lo para o bojo dos fatos", disse Lewandowski quando interrompido pelo presidente do STF, Carlos Ayres Britto, que leu parte do depoimento do petebista, ressaltando que o acusado não voltou atrás no seu depoimento. Para o revisor, a viagem Portugal destinou-se, exclusivamente, a discutir a venda da Telemig a Portugal Telecom.
As reuniões entre José Dirceu, Marcos Valério e a cúpula do Banco Rural não são indicativo de que o ex-ministro teve participação nos empréstimos fraudulentos que irrigaram o esquema, afirmou Lewandowski. Os encontros receberam destaque no voto do relator, Joaquim Barbosa, que votou pela condenação de Dirceu. "Ele compareceu a este encontro, mas (o executivo do Rural ouvido no processo) Plauto Gouvêa asseverou que os aludidos empréstimos não foram discutidos com José Dirceu", disse.
O revisor desqualificou outra prova apresentada no voto de Barbosa, a venda de um apartamento de Maria Ângela Saragoça, ex-mulher de Dirceu, com ajuda de Rogério Tolentino, advogado de Marcos Valério. "Ficou comprovada que Maria Ângela era amiga do ex-secretário do PT Silvio Pereira, e foi através dele que conseguiu contato com Marcos Valério", disse.
No fim de seu voto, Lewandowski afirmou que não cabe a aplicação da teoria do domínio do fato para condenar José Dirceu. Pela tese, o ex-ministro da Casa Civil tinha o completo domínio de sua função, de chefe da Casa Civil, e poderia ser condenado mesmo sem provas diretas de sua participação na compra de apoio parlamentar.
Lewandowski afirmou que a teoria do domínio do fato foi criada para punir os chefes dos soldados que matavam alemães que tentavam pular o Muro de Berlim. "Não estamos em guerra, felizmente, não estamos em situação de convulsão intestinal, como diriam os textos jurídicos antigos, para identificar revoluções, rebeliões", defendeu.




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